domingo, 13 de maio de 2018

A fé retratada em obra do paraibano Flávio Tavares

(Foto: Reprodução)

Retratar na tela a paisagem do Sagrado, a vida dos Santos sempre cativou pintores em todos os tempos. Nem todos retrataram com fidelidade a beleza do Sagrado, o exterior do Divino e a existência humana dos Santos. A Capela Sistina, no Vaticano, é a súmula desta criação. No Brasil, muitos conseguiram expressar com argila ou com tinta a paisagem que a religiosidade oferece. Se Aleijadinho expressou com pedra o que existe de mais profundo no olhar de um artista, pintores continuam buscando o registro da vida de pessoas que, por seus atos e atitudes, são considerados santos. Ser santo é praticar obras que enriquecem o panorama do relacionamento humano.

Na Paraíba, Flávio Tavares cedo conquistou a imortalidade com sua arte de pintar quadros majestosos, de forma poética, e abundantemente recria a paisagem da História de nossa terra, em telas cheias de fatos relevantes que saem das páginas dos livros para os quadros. Ele, desde o tempo de sua adolescência, tem se dedicado à pintura de quadros onde estão seu olhar místico e a contemplação da vida próxima de práticas da religiosidade.

Católico, em cuja família nasceu e foi educado, a sua mãe devotava apreço por Nossa Senhora visto que integrava o Grupo de Filhas de Maria, daí vem seus primeiros olhares para o Divino. Nos anos sessenta do século passado, quando começou a participar das aulas de pintura com o professor Raul Córdula, teve o deslumbramento ao participar com os demais alunos do mundo encantador existente entre as paredes do Convento São Francisco. O professor recomendava reproduzir em desenhos os anjos e santos retratados nos altares e nas paredes do velho templo que marca a presença inicial dos religiosos franciscanos na Paraíba.

“Trago comigo este olhar para o místico, para o Divino”, comentou Flávio quando, recentemente, apresentava sua mais nova obra de arte feita em louvação a Nossa Senhora das Mercês, uma mulher que se destacou na Espanha quando aquele país europeu passava por situação de penúria e atrocidades. Sua atuação como mediadora de conflitos, a levou aos altares da Igreja, sendo venerada em todo o mundo católico do Ocidente.

Para atender a uma demanda da família que desejava ter uma pintura retratando o mundo da santa, de quem é muito devota, Flávio debruçou-se por meses nesse trabalho. Pesquisou sobre a vida e sobre a devoção a Nossa Senhora das Mercês que, hoje, está presente em todo o mundo. Na concepção do quadro, ele fez uma junção da paisagem da antiga Espanha, com seus castelos medievais, com a atualidade da Paraíba, onde existe uma igreja dedicada à santa.

O quadro tem uma beleza estética refinada, pois ele trouxe uma dimensão de grandeza da arquitetura dos templos residenciais e religiosos da Espanha, pontificados pela nobreza, para a paisagem da Paraíba.

“É um quadro que me atingiu muito este lado mítico e católico, talvez mais do que outros que tenho pintado. Gosto muito e sempre voltou à temática do religioso, até porque sou católico”, justificou.

Neste quadro, denominado de “Nossa Senhora das Mercês, Padroeira da Libertação dos Escravos”, ele usou uma cor de pôr de sol, que na mente se traduz cor dourado, dando uma auréola na cabeça da Santa. É um quadro onde tem muitas pessoas ali representadas. Lembra as raízes culturais trazidas ao Brasil nos séculos passados e, de modo especial à Paraíba. “Temos muito das culturas ibéricas”. 

A santa imaginada por Flávio tem as características da mulher nordestina, precisamente da Paraíba, que recebe a aureola na sua cabeça, dando-lhe a dignidade de rainha.

É um quadro elaborado pacientemente porque tem muitas figuras pintadas. A mulher retratada é uma figura típica do Nordeste, talvez mais brejeira, que tem traços da miscigenação do índio. O artista trouxe a Espanha para perto de nós.

Ao lado de Nossa Senhora, com olhar piedoso e agradecido, estão Maria com seu filho Jesus ao colo, a sua Mãe Santa Ana e, junto, ao lado oposto, como que sem entender a majestosa figura humana, o artista colocou São Pedro Nolasco, São Raimundo do Peñafort e o Rei Dom Jaime da Espanha, ajoelhados, em posição de veneração. Com esta cena, Flávio criou e deu dignidade a igreja familiar. Uma igreja que está de maneira forte e sempre presente dentro do nosso imaginário.

Outro objeto de grande significado nesta pintura é a corrente partida, que representa a insígnia da libertação e o escapulário trazido na mão como símbolo do Terço, muito usado pelos fiéis durante a oração e que visualiza a devoção.

Flávio não esconde que tem muito apreço por este quadro, mesmo que não disfarce a admiração e o apego que igualmente desfruta por muitas outras telas de sua autoria.
Revelou que quando começou a pintar, ainda criança, escutava sua mãe dizer que nos seus quadros tinham iluminação divina. Quando instado a falar sobre a religiosidade e o místico em sua pintura, arremata: “Sou um homem de fé. Sou católico e minha mãe era Filha de Maria”.

No seu quadro, Flávio reproduziu mais uma presença de Nossa Senhora na paisagem de outra cultura.

Entre os muitos títulos atribuídos à Virgem Maria, está o de Nossa Senhora das Mercês, outorgado no ano de 1218, há exatos 800 anos, quando em sonho, São Pedro Nolasco, São Raimundo do Peñafort e o Rei Dom Jaime da Espanha que teriam tido uma visão de Nossa Senhora pedindo para lutarem pela libertação de cristãos escravizados pelos musculamos. Criaram a Ordem Real, Celestial e Militar de Nossa Senhora das Mercês para a Redenção dos Cativos, denominada de Ordem dos Mercedários, surgindo o nome de Nossa Senhora das Mercês. No Brasil, a devoção chegou por volta do século XII, trazida por frades e difundida, principalmente, entre os escravos. Na Paraíba, a devoção é muito grande, sendo padroeira da cidade de Cuité, localizada no Curimataú.

Trata-se de uma imagem rica em símbolos. A palavra “Mercê” significa favor, perdão, indulto, libertação da escravidão em todos os sentidos.

A coroa tem doze estrelas, lembrando a realiza da Virgem Maria e a veste branca simboliza a pureza de seu coração.

O dourado na veste significa que se trata de uma mulher que veio do céu. Já o escapulário branco à frente do peito significa proteção. O escapulário é símbolo da luta pela libertação da escravidão. Por sua vez a cruz é o símbolo de Cristo, aquele que venceu o mal, oferecendo a libertação de todos que creem.

A corrente partida é a libertação definitiva. Algumas imagens aparecem com Nossa Senhora das Mercês carregando uma rosa na mão, significando a doçura, a bondade.

Fonte: A União

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